Arte e Arte

Arte e Arte

Estive ministrando uma disciplina acadêmica intitulada Arte e Educação no início desse ano. No projeto do curso havia objetivos a serem alcançados, entretanto sempre há objetivo (ou objetivos) que a gente estabelece paralelamente. Objetivos nem sempre técnicos ou mensuráveis por nota ou conceito. Mais se assemelhando a uma meta subjetiva que propriamente se parecendo com um objetivo.

Queria que os alunos entendessem algo essencial sobre a atividade artística que está muito perto do que eu penso a respeito. Queria derrubar o senso comum de que arte é algo bonito, emocional, alegre… Afinal, como afirma Alfredo Bosi, “belo é o que nos arranca do tédio e do cinza contemporâneo e nos reapresenta modos heróicos, sagrados ou ingênuos de viver e de pensar. Bela é a metáfora ardida, a palavra concreta, o ritmo forte. Belo é o que deixa entrever, pelo novo da aparência, o originário e o vital da essência”.

Queria também derrubar o mito de que arte é dom, talento, capacidade inata, inspiração e só. Queria que entendessem, mas não só entendessem, que tivessem algo perto de si para reforçar o quanto talento não basta. Para mostrar, por experiência própria, uma trajetória em desenvolvimento, com erros, muitos erros para se obter êxito. Alguém que complementasse e completasse… pois, eu não pretendia supervalorizar o saber acadêmico, escolar. Afinal, estudar, ensinar e aprender acontece em muitos lugares e a escola ou academia é apenas um desses lugares.

A disciplina era compactada: manhã e tarde e duraria de segunda à sexta. Logo no segundo dia solicitei que procurassem artistas da cidade para levarem para conversar conosco sobre suas atividades estéticas. Artistas variados: músicos, pintores, dançarinos, escritores, artesãos, cantores, etc. Enquanto isso a disciplina ia carregada de teoria. De cansar o quengo! Para quebrar a expectativa daqueles que esperavam passar uma semana de recreação, de brincadeira.

Nisso conheci muitos artistas, terei algo especial para dizer sobre cada um deles (talvez volte a falar sobre os mesmos em alguma crônica no futuro). Entretanto, a presença do senhor Chico Pintor, que no decorrer daquela semana estava pintando a escola. Ele que é pintor de paredes e pintor de quadros falou com firmeza e desenvoltura sobre seu ofício de pintor de paredes para garantir a sobrevivência e sobre seu “ofício” paralelo de pintor de quadros para seu deleite pessoal.

Ele que estudou pouco em escolas era senhor de seu território e mostrou caminhos que trilhou. Demonstrou conhecimento de técnicas e de nomenclaturas próprias da pintura. Falou de dificuldades técnicas, o que conseguia e o que não conseguia fazer. Dos exercícios, dos erros, muitos, dos acertos. Em suma: ele nos arrebatou. Resumiu tudo quanto eu fui tentando meter a custo na cabeça dos alunos nos quatro dias anteriores. Parecia até que já nos conhecíamos e que havíamos combinado o que dizer.

Encerrei a Arte e Educação com duas certezas: meus meninos e meninas certamente aprenderam não só o que eu desejava sobre arte, mas aprenderam também a dar o devido valor ao aprendizado não-scholar.

Belém, 04 de maio de 2011.
Abilio Pacheco

2 comentários em “Arte e Arte”

  1. Olá Pacheco,
    Arte e Educação como qualquer disciplina requer a elaboração e/ou formulação de objetivos que podem auxiliar o professor na tarefa de ensinar e avaliar seus alunos: são os objetivos gerais e os objetivos específicos.
    Os objetivos gerais são mais amplos e abrangentes o que se espera como consequencia da aprendizagem. Por exemplo: – conhecer o movimento literário do Modernismo. Então, este objetivo está amplo e é necessário desdobra-lo ou traduzi-lo em objetivos específicos, a fim de que se possa ser trabalhado e avaliado o seu alcance:

    *Descrever o acontecimento da Semana da Arte Moderna de 1922;
    *Citar obras e autores pertencentes ao Movimento Modernista;
    *Caracterizar o estilo modernista.

    Quanto às metas não devem ser subjetivas e sim acompanhadas ou definidas em ações. Por exemplo: – A importância da Educação Artística no mundo atual. Então as ações que você mencionou no seu texto estão ótimas: “procurar artistas da cidade (músicos, pintores, dançarinos, artesãos… para conversar sobre estética”, e sobre as vivências que possuem na área. O exemplo do pintor ,também está MBOM. E finalmente a avaliação que funciona como um (” feedback”) tanto para o aluno como para o professor.

    Curtir

  2. Muito interessante o relato que você faz desta atividade desenvolvida junto aos seus alunos com a participação de pessoas
    que se aprimoraram através da própria experiência de vida, sensibilidade e bom senso independente de conteúdo livresco.

    Curtir

Deixe um comentário