pães podres
– abilio pacheco
acordei com uns versos de um poema
se repetindo na minha cachola:
nossas manhãs estão fartas de pães podres
que nos são impostos e que comemos à seca
revirei meus rascunhos a procura
destes versos que me soaram brechtianos
comemos pela manhã à mesa farta
– digo-me de memória um dos versos –
um pão apodrecido que nos impõem
– prossigo inseguro um segundo –
todas as manhãs em silêncio mordemos
certeza que eram de brecht
li dele o que eu tinha à mão
repetindo os versos com variações
não encontrei, entretanto, nenhum
pão matutino podre mordido às secas
– a metáfora do pão não é de brecht
tampouco tenho certeza que seja minha
por isso, não sei se escreverei o poema
sobre os pães podres que nos têm servido